Gramado, 14 de agosto de 2023.
Numa tarde voltada à tecnologia, nesta sexta-feira (11/8), a Arena Maragatos também deu espaço a uma discussão importante: com o tema “Lei Kiss – 10 anos: Destaques e Desafios”, a 78ª Soea trouxe à tona o quanto se avançou em relação à política de prevenção a incêndios após a terrível tragédia na Boate Kiss, em Santa Maria-RS.
Professora das disciplinas “Noções Básicas de Segurança Contra Incêndio” e “Tópicos Avançados em Engenharia de Segurança Contra Incêndio” na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a palestrante eng. civ. Ângela Gaio Graeff é criadora do curso de Especialização em Engenharia de Segurança Contra Incêndio e coordenadora do Fire (do inglês, Fire Investigation, Reserach and Engineering), grupo que se propõe a estimular a cultura da prevenção contra incêndios.
“Vou começar essa palestra dizendo que eu não queria estar aqui”. Com essa inusitada primeira frase, a professora relembrou a infame origem da Lei Kiss. “Não estamos comemorando os 10 anos da lei, mas vivendo um marco negativo e muito triste do que aconteceu na década passada”.
O que é a Lei Kiss
No dia 26 de janeiro de 2013, um incêndio na boate Kiss, localizada na cidade de Santa Maria, foi o foco das notícias em todo o país. No total, 242 jovens morreram e mais de 600 ficaram feridos. Quatro anos após o incêndio, foi sancionada a Lei de Prevenção e Combate a Incêndios e Desastres nº 14.325, que também ficou conhecida por Lei Kiss.
A lei estabelece novas diretrizes para a prevenção e combate a incêndios e desastres em estabelecimentos, edificações e áreas de reunião públicas. Ela também define em quais casos agentes públicos podem sofrer penalidades por agirem em prol de benefício próprio em relação a alvarás e permissões. Por fim, ela caracteriza a prevenção de incêndios ou desastres como condição para a execução de apresentações artísticas, culturais, de esportes, entre outros, e atribui responsabilidade para o descumprimento das regras aos órgãos de fiscalização.
“Ela foi uma grande resposta a uma das maiores tragédias na área da segurança contra incêndio que já aconteceu aqui no Brasil”, introduziu.
Um outro aspecto interessante proporcionado pela lei é que ela define a obrigatoriedade de conteúdos relacionados à segurança contra incêndio nos cursos de engenharia e arquitetura, além dos cursos técnicos correlacionados em execução no país.
Histórico
“Até a década de 1950, pouco se fez sobre o assunto aqui no Brasil”, disse Ângela. De acordo com ela, o principal impulso nos projetos voltado ao assunto foi o surgimento do Instituto de Resseguros do Brasil, o IRB(Re), que criou algumas portarias, regulamentos e procedimentos normativos para o manejo de extintores de incêndio e hidrantes. Isso se deu porque, como um segurador de edifícios, o instituto viu a necessidade de se precaver ante este tipo de sinistro.
As próximas duas décadas viriam a marcar os maiores incêndios registrados no Brasil, como por exemplo, o do Grande Circo Norte-americano, que aconteceu nos anos 1960 no Rio de Janeiro, e é conhecido por ser o maior incêndio em número de vítimas. Outro que teve grande repercussão foi o do Edifício Joelma, na década de 1970, e que até hoje é pauta recorrente de documentários e reportagens jornalísticas.
“No caso do edifício Joelma, por ele ter sido localizado no coração de um centro urbano, a comoção nacional fez os meios técnicos e políticos se mobilizarem em função de uma nova revisão de normas”, explicou Ângela, ainda relatando que o estado de São Paulo foi quem despontou com novas regulamentações estaduais sobre o assunto.
Novos desafios
Apesar de a Lei Kiss ter trazido avanços, Ângela destaca que ainda há muito a caminhar. “Ainda falta fixar prazos para adequação das edificações à lei, que hoje ainda não existem por razões econômicas, mas falta também que haja mecanismos de financiamento que possam ajudar neste ponto”, sugeriu.
Ângela ainda apontou outros tópicos como a falta de exemplo nos edifícios do poder público, a necessidade de um maior rigor nas fiscalizações e penalidades, e também uma reestruturação cultural de como a prevenção a incêndios deve ser tratada no Brasil.
“A gente tem que enxergar não apenas com o olhar do projetista, técnico, mas também com o olhar humano. Se não for desta forma, não conseguiremos superar a barreira cultural que temos nesta área”, concluiu.
Reportagem: Felipe Moreno (Crea-AL)
Edição: Henrique Nunes (Confea)
Equipe de Comunicação da 78ª Soea
Fotos: Stúdio Feijão & Lentilha