
Brasília, 5 de agosto de 2025.
Ricardo Hirata construiu sua trajetória entre a ciência e o compromisso social. Geólogo com mais de quatro décadas de atuação, é hoje um dos principais nomes da hidrogeologia na América Latina. Trabalha com desenvolvimento de tecnologia, pesquisa aplicada e formação de pessoas — sempre em defesa da sustentabilidade do planeta e responsabilidade pública, como faz questão de ressaltar: “A água subterrânea abastece 60% da população mundial e regula o ciclo hidrológico que sustenta a vida como a conhecemos”.
Hirata participou de projetos em mais de 30 países, em cinco continentes, inclusive como consultor para a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e a International Atomic Energy Agency (IAEA). Dentre os frutos mais expressivos, destacam-se os métodos de avaliação de vulnerabilidade e risco de contaminação de aquíferos — GOD e POSH —, hoje adotados em políticas públicas de diversos países. Seus manuais de referência, desenvolvidos para a Organização Mundial da Saúde e para o Banco Mundial, somam mais de 5 mil citações em bases acadêmicas.
Por mais de uma década, integrou o Groundwater Management Advisory Team (GWMATe) do Banco Mundial, equipe que atuava em soluções de gestão da água e da qualidade hídrica na América, Europa, África, Ásia e Oceania. Dessa experiência, nasceram publicações técnicas de referência e a contribuição direta para criação de políticas públicas em diversas nações.
Outro ponto alto da carreira é o trabalho como educador, especialmente na USP, onde é professor titular desde 2016. Na fase mais madura da trajetória, concebeu e liderou o Sacre — Soluções de Água para Cidades Resilientes. Financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), a iniciativa reúne universidades e instituições governamentais nacionais e internacionais em um esforço para reduzir a vulnerabilidade de cidades e zonas rurais às crises hídricas causadas pelas mudanças climáticas. Para ele, o projeto representa a síntese de tudo o que construiu: uma oportunidade de aplicar, em larga escala, ideias que desenvolveu e aprimorou ao longo dos anos, e ainda fazer isso ao lado de parceiros que o têm acompanhado ao longo das décadas e compartilham a mesma visão.
Em 2025, Hirata figura entre os profissionais de destaque do Sistema Confea/Crea. A premiação será entregue em outubro próximo, durante a 80ª Semana Oficial da Engenharia e da Agronomia (Soea), em Vitória (ES). Confira na entrevista a seguir os detalhes dos projetos realizados por este profissional da Geologia:
Confea: Quando o senhor percebeu a vontade de seguir em sua profissão?
Ricardo: Eu diria que essa decisão aconteceu em dois momentos. O primeiro foi no fim do colégio, quando escolhi a Geologia. Eu buscava uma profissão ligada à natureza e à pesquisa científica — sempre tive esse fascínio por descobertas. O segundo momento veio no final da graduação, quando fiz um estágio no Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) — hoje SP Águas — em São Paulo. Ali percebi que o trabalho do geólogo podia ter um impacto social direto e significativo. Descobri a hidrogeologia, e percebi que atuar com água subterrânea era contribuir com algo essencial: esse recurso abastece 60% da população mundial e regula o ciclo hidrológico, sustentando a vida como a conhecemos.

Confea: Quais foram as principais referências para essa trajetória?
Ricardo: Tive a sorte de ser cercado por grandes profissionais ao longo da vida — pessoas que me inspiraram e, acima de tudo, se tornaram amigos. A Rosa Beatriz Gouveia da Silva foi minha chefe no DAEE e me ensinou como aplicar ciência na resolução de problemas concretos de recursos hídricos. Já o Gerôncio Rocha me mostrou a importância de aplicar esse conhecimento técnico às políticas públicas, e o valor do serviço público nesse processo — algo essencial num momento em que essa função é tão pouco valorizada. Mas o profissional que mais me influenciou foi Stephen Foster. Ele foi meu chefe na Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), depois no Banco Mundial, e hoje está na International Water Association. Com ele, aprendi sobre planejamento estratégico e sobre a construção de políticas e governança das águas. Junto com o professor Emílio Custodio, falecido recentemente, Stephen é, sem dúvida, um dos hidrogeólogos mais influentes da América Latina. E não posso deixar de mencionar o Robert Cleary, meu orientador de mestrado, que me indicou para o pós-doutorado na Universidade de Waterloo — à época, o maior centro de pesquisa em águas subterrâneas do mundo.
Confea: Quais são seus principais projetos e feitos ao longo da carreira?
Ricardo: São 42 anos como geólogo, com atuação em mais de 30 países e envolvimento em projetos que renderam prêmios e reconhecimentos de governos e instituições. Entre os trabalhos mais relevantes, destaco o desenvolvimento dos métodos GOD e POSH para avaliação da vulnerabilidade e risco de contaminação das águas subterrâneas. Eles hoje fazem parte de políticas de proteção hídrica em diversos países. Participei também do Groundwater Management Advisory Team (GWMATe) do Banco Mundial por mais de dez anos, colaborando com soluções para gestão da água em dezenas de países da América, Europa, Ásia, Oceania e África. Dessas experiências nasceram publicações importantes que ajudaram governos a definirem políticas públicas. Outro aspecto que valorizo muito é a minha atuação como professor universitário. Formei mais de cem pesquisadores entre iniciação científica, mestrado, doutorado e pós-doutorado, além de ter lecionado para mais de mil alunos em cursos de graduação, pós-graduação e treinamentos profissionais. É uma semente que vai se espalhando.
Confea: Entre todos esses feitos, qual o senhor destacaria?
Ricardo: Destaco o projeto Sacre – Soluções de Água para Cidades Resilientes. Ele representa um marco por reunir ciência de ponta com impacto social concreto. É um projeto temático da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), resultado de um consórcio entre instituições universitárias e governamentais nacionais e internacionais, com o objetivo de reduzir a vulnerabilidade de cidades e áreas rurais às crises hídricas provocadas pelas mudanças climáticas. O Sacre se apoia em quatro pilares: ciência e tecnologia originais, políticas públicas, formação de profissionais qualificados e comunicação social. Ele aproxima a universidade da sociedade naquilo que ela tem de mais valioso: a capacidade de gerar soluções sustentáveis. Pessoalmente, o Sacre é a oportunidade que tive de colocar em prática muitas ideias amadurecidas ao longo da vida — e melhor ainda, de realizá-las junto de colegas e amigos de longa caminhada.
Confea: Qual a importância deste reconhecimento pelo Sistema Confea/Crea?
Ricardo: Primeiramente, me senti profundamente honrado pela indicação feita pela Associação Brasileira de Águas Subterrâneas (Abas), uma instituição de grande relevância na minha área de atuação. E receber este prêmio pelo Sistema Confea/Crea e Mútua eleva ainda mais esse reconhecimento. É como se o principal sistema profissional do país dissesse, com todas as letras: a água subterrânea importa. Essa premiação valoriza um setor muitas vezes invisível aos olhos dos tomadores de decisão e até de parte da sociedade. Estou no fim de uma carreira de mais de quatro décadas, e esse reconhecimento confirma que a trajetória valeu a pena — que houve impacto, contribuição e, acima de tudo, que meu trabalho ajudou a tornar o mundo um pouquinho melhor.
Gabriela Arruda
Equipe de Comunicação do Confea





